domingo, 31 de maio de 2015

Lado perdido

A pureza das crianças sempre me tocou. E até hoje não é diferente.
Enquanto aguardava na recepção de onde ministro aulas de ballet compartilhei boas gargalhadas com um pequeno que pareceria ter uns 5 anos e sua mãe com um de 2 semanas no colo.
- Qual o seu nome? - Perguntei
- Kauã!
Nisso a mãe começou a rir, pelo simples fato de eu estar interagindo depois de muito tempo de inquietude do menino. Minha tentativa era de fazê-lo interagir com outras coisas, visto que já estava há muito tempo brincando com uma torre de copos. 
- Quantos anos você tem?
- 8.
Oito? OITO? O-I-T-O? Meu Deus, ele tinha meio metro de altura! 
- Onde você estuda?
- No 29. - Uma escola pública aqui da minha cidade.
- E você gosta de estudar?
Silêncio.
- Gosta? - Repeti. 
Nesse momento a mãe o mandou responder. Ouvi um "aham!" bem baixinho.
Continuei puxando conversa e fazendo perguntas aleatórias. Descobri que ele gosta de brincar de carrinho e ainda não sabe o que quer ser quando crescer.
Deu minha hora, levantei em direção à porta de entrada e falei um “tchau” para a família que ali aguardava. Enquanto ia saindo fui surpreendia com uma corrida seguida de um abraço.
- Obrigada por conversar comigo! - falou.
- Ah! Que isso! Dá cá um beijo! Sempre que quiser trocar ideias pode me procurar aqui! 
Recebi mais um abraço de urso. Agora eu tinha um pequetito entrelaçado no meu pescoço. Ele apertou tanto que parecia que queria ir junto comigo.
Que criança adorável. Mesmo com toda a bagunça que ali fez. Tinha uma leveza de criança que muitas vezes não vemos mais por aí.
Ele usava roupas de criança e agia como uma - apesar de ser achar o adulto do recinto, como toda criança.
Observe que em apenas 2 parágrafos usei a palavra "Criança" quatro vezes. Sim, pois ela está presente em mim. E deve estar em você também. Não entendo porque perde-se essa característica quando se acha que já é adulto. Ninguém é adulto por completo. 
O medo de deixar o lado infantil florescer é maior que a vontade de demostrá-lo de vez em quando. Além disso, a opinião da sociedade importa mais do que a nossa.
Permita que seu lado interior floresça e faça jus ao que você é, e não ao que os outros querem que você seja.

Carolina Gomes

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Até logo que vira adeus

Eu nunca soube lidar com a morte. Talvez por ter crescido sem ter contato direto e intenso com ela. A morte desavisada é dolorida. Transforma um até logo em adeus em questão de segundos. 

Tanto que hoje, mesmo quando não sou próxima de alguém que morre, me abala. O fardo pesado que é ter que lidar com a fugacidade da vida. Em um dia, a pessoa está ali, no outro, se foi. Acabou. E os planos? Só restaram danos, enganos. 

A morte chega pra todos nós de alguma forma, e é a única certeza de viver. Mas morrer em vida é pior. É como dizem por aí: Vinicius morreu aos 60, mas viveu 120. Viveu como quis. Amou muitas e muitas vezes. E não se reprimiu. Se entregou à vida, pra quando tivesse que se entregar a morte, que o fizesse em paz consigo mesmo. É melhor se arrepender do que a gente fez, do que daquilo que não fez. 

Um caminhão, por cima de uma moto, e fim. Tudo aquilo que deixamos pra amanhã, já não pode ser feito, por que o amanhã já era. Vai deixar pra viver depois? 

Júlia Fagundes

domingo, 24 de maio de 2015

É arte!

Podem me criticar o quanto for, mas se eu ver um artista de rua dou algumas moedinhas.
Seja aquele que toca uma flauta ou um violão. Ou aquele que usa tinta a óleo pra pintar, com dedos, lindos quadros em azulejos. 
Já esbarrei com seu Zé das poesias grátis - pegue quantas quiser e deixe quanto puder. Com João, daquele velho café da esquina, que, sagradamente, se apresentava todos os domingos pela manhã.
Nas saídas dos museus, já vi o Carlitos, o Faraó, Avatar e até o Indiana Jones, que de baixo de um sol quente estavam lá com a tinta escorrendo pelo corpo. Batucadas em potes de alumínio já foram trilha sonora na saída do Pão de Açúcar. Ao lado, uma placa dizia: faço poesia, me conte sua história.
Uma capa de uma viola aberta e pronto, o show começa. Tom, Vinicius, Chico, Milton.. Já ouvi de tudo pela ruas a fora. E sim, paro, dou atenção, as moedas e sigo meu caminho.
É arte! É trabalho! Merece respeito. Nesse país, poucos, mas muito poucos, são os artistas que conseguem o reconhecimento mínimo. Isso depois de muito trabalharem e, muitas vezes, depois de suas artes terem sofrido plágio.
Falaram por aí que artista no Brasil não tem vezes.. Tem sim! Pois - Graças a Deus - ainda temos pessoas que acreditam no poder da arte.

Carolina Gomes

quinta-feira, 21 de maio de 2015

O poder de sofrer na hora certa.

Sem "não chora não." Chora sim. Chora muito. Mas chora e para. Sofrer na hora certa é uma dádiva. Se acabe instantaneamente, mas não se acabe aos poucos. Por que aos poucos o sofrimento é arrastado, e o que era pra ser um momento triste, se torna uma semana triste, um mês, um ano. Se permitir chorar é preciso. Quando a gente acha que é o fim do mundo, deixa achar. Esperneia, grita, se irrita, fica triste, derrotada. Mas levanta depois e continua seguindo em frente, por que tem mais caminho à espera... E esse caminho precisa urgentemente ser andado de cabeça erguida, por que quem olha muito pro chão, uma hora o encontra.. 

Júlia Fagundes

quinta-feira, 14 de maio de 2015

Através do portão

Primavera. A temperatura estava amena e era mais um dia para Dona Cila. Atrás de um portão velho de ferro se escondiam a senhora e sua companheira, a cadeira de balanço. Passava horas ali, analisava o voo dos pássaros e o balançar das folhas das árvores.
Ao lado, uma casa pequena, velha e bem bagunçada. As janelas já estavam emperradas, e só havia uma porta para entrar e sair. Saia apenas para a varanda, onde havia um vaso com o caule seco de uma velha orquídea, que apesar de ser primavera fazia dois anos que não dava flor.
Foi no vai e vem de sua cadeira que Dona Cila viu as transformações da vida: uma lagarta que virou borboleta, a garoa que virou tempestade e sua filha, que a visitava uma vez por semana para renovar o estoque de comida e remédios e tomar a benção. "Boa-tarde" e "Que Deus te abençoe" eram as únicas palavras que saiam da boca de ambas naquela casa.
A filha cresceu, casou-se, procriou e a senhora continuou a se balançar na velha cadeira. A solidão se fazia presente a cada dia. E no abrir diário dos álbuns de fotos, Cila se lembrava dos eventos passados. A cada passar de páginas era um sentimento diferente. Pessoas que já se foram, outras que cresceram e nunca mais voltaram. O intervalo de visitas semanais aumentou. Uma vez por mês. De seis em seis meses. De ano em ano, até nunca mais.
Ela fora esquecida e deixada de lado, igual se deixa uma velha blusa. Os remédios foram consumidos por completo. A comida acabou. A vida, também. Agora a cadeira ficou só.
Uma vizinha que passava todos os dias e a via balançando, notou sua falta, e correu para avisar a filha.  Cila foi encontrada morta uma semana depois de seu falecimento. Mas apesar da solidão, foi encontrada viva no coração daqueles que das fotos fizeram as lembranças.

Carolina Gomes

domingo, 10 de maio de 2015

Segundo domingo de maio.

Quando eu era pequena, minha mãe era a pessoa que mais ouvia minhas tagarelices por horas a fio, até gritar "você engoliu uma vitrola??!" Conforme eu fui crescendo, e fui entrando naquela fase "adolescente rebelde", eu tinha em mim muitas certezas que hoje foram pro beleléu. Eu nunca fui uma adolescente que trouxe problemas sérios. Nada de bebida, nada de droga, nada do tipo. O trabalho que tinham comigo era simplesmente por que àquela altura do campeonato, achando que sabia muito da vida (não que hoje eu saiba, por que não sei nada), eu achava que a criação dos meus pais era errada pra mim. Que eles me prendiam muito, e não deixavam eu fazer o que eu quisesse. Que a minha mãe não gostava que eu saísse, que eu namorasse. Hoje eu agradeço por toda proteção que me deu. Hoje eu vejo que ela me criou pro mundo, mesmo que eu achasse que ela me criasse pra ela. Ela me mostrava que as vezes as pessoas podiam ser ruins com a gente, e que dessas pessoas, a gente mantinha distância. Ela me mostrava que se divertir e sair é válido, mas que tudo em exagero faz mal. Que a gente tem que ter responsabilidade, compromisso, e noção de que temos que trabalhar duro por aquilo que a gente quer. Que a gente tem que levar a vida com bom humor, pra rir da gente mesmo. A minha mãe me ensinou muito até hoje. E ensina sempre. Mesmo sem dar lições, ela ensina fazendo. Ela nunca precisou sentar e me dar uma aula do que fazer. Entre conversas, ela me ensinava dando o exemplo. Hoje eu quero ser pelo menos metade da mulher que minha mãe é. 

A minha mãe é guerreira e não desiste de nada que realmente sabe que consegue. Ela faz de tudo pelas filhas, e isso é incrível. A minha mãe tem a melhor gargalhada. A minha mãe tem o melhor abraço. A minha mãe tem as melhores histórias, a minha mãe tem as melhores doideiras. A minha mãe me rende as melhores risadas. A minha mãe é um grande exemplo pra mim, de que quando a gente quer, não tem nada que nos impeça de conseguir. Que o nosso melhor incentivo é a nossa vontade. 

Mãe, eu nasci a cara de papai, mas quero ser como você! (Um pouco como ele também, vai) Te amo! Feliz segundo domingo de maio! 

Julia Fagundes

quinta-feira, 7 de maio de 2015

O Nordeste é lindo!

Na última ia à Cidade Maravilhosa visitei o Museu de arte do Rio de Janeiro (MAR). Fiquei encantada. O museu é a cara do Rio, super charmoso e, claro, com o balanço do mar. Sou suspeita. Sempre fui apaixonada por museus. Nessa mesma viagem visitei mais de 8.
Ao entrar na exposição do "Homem do Nordeste" fiquei encantada com tanta arte e cultura que representa uma parte linda do nosso país. E com as ótimas coincidências da vida, ao caminhar pela galeria avistei um casal um tanto inusitado pra a cidade, mas não para a exposição: um típico casal nordestino. Fiquei feliz ao vê-los tão humildes, apreciando sua própria história e identificando os fatos. Bateu a dúvida se elas faziam parte do museu ou não. Então, mais que depressa corri até o segurança mais próximo e perguntei:
- Eles são da exposição ?
- Não, eles estão visitando mesmo. - respondeu. Mas até hoje não sei se ele falou a verdade.
Desejei um bom dia e voltei a apreciar o casal. De fato passei mais tempo os observando do que vendo as obras em si. Achei interessantíssimo eles estarem vendo a própria história e me mostrando a história viva. A cada passar de esculturas, camisas e vídeos da região eles olhavam e muitas vezes falavam:
"- Alá, eu já fui ali!"
O Nordeste é mesmo lindo! Ainda me apavoro com as pessoas que o julgam por aí falando simplesmente que é uma região pobre e de pouca chuva. É uma das das mais, se não for a mais, rica em cultura do nosso Brasil. E cultura é riqueza sim!
O fato é que aquele casal, que me parecia vir de tão longe, me abriu os olhos pra as partes do Brasil que são esquecidas, e muitas vezes, excluídas e só lembradas quando há algum interesse.
Nosso Brasil(zão) tem MUITA coisa bonita guardada, que pode ser implantada em outras regiões, somos vários países dentro de um só. Todos temos uma Maria Bonita e um Lampião guardado em algum canto.

Carolina Gomes

domingo, 3 de maio de 2015

Com amor, eu

Querido amor, 
se você está lendo essa carta, significa que eu parti dessa pra uma melhor. Você sabe que eu acredito naquela coisa toda de vida após a morte, então eu espero que eu tenha ido pro céu. Se eu não fiz o suficiente pra que isso aconteça, faça por mim e seja sempre uma pessoa boa, como já era de costume seu. 

Quero que saiba que você me fez feliz. Você foi meu amor incondicional. E que se um dia brigamos, eu passei a briga inteira torcendo pra que acabasse logo e eu ganhasse um abraço apertado. É que você sabe, a vida é muito curta pra perder tempo com essas coisas. Até o momento que te escrevo isso, permanecemos intocáveis, sem brigas, sem bate boca. Todo problema resolvido no diálogo. 

Eu vou sentir saudade. Sei que você também. Mas tenho um pedido: arranje outra. Arranje mesmo, alguém que te faça sorrir, e esteja ao seu lado sempre. Por que eu já te disse isso: amar é querer a felicidade do outro, independente de quem a traga. E no momento eu não posso estar perto, então só quero que seja feliz. 

Sei que ninguém vai substituir nossos longos olhares fixos, nossos sorrisos intermináveis, nossa diversão ao pé do fogão, ou nossas gargalhadas. Mas a felicidade pode vir de jeitos diferentes. Procure algum. Não se lamente por muito tempo pela minha morte, um dia a gente se encontra. E enquanto isso não acontece, não tem como voltar, e a sua vida não para pra um momento de sofrimento tão longo. Sofra intensamente por alguns dias. Mas revigore-se e mantenha apenas a saudade. 

Eu vivia com medo da sua morte. É egoísta, mas eu sempre tinha pra mim que seria mais fácil morrer do que te ver partir. E foi, tenho certeza. Te deixar pode ter me doído, mas te ver partir seria ainda mais difícil. Por isso aonde você ia, eu queria notícia. Não era ciúme, não era medo da traição. Era medo de uma tal dona morte. Pode parecer macabro viver pensando nisso, mas queria sempre fazer de tudo pra te proteger ao máximo, pra ter você sempre pertinho.

Vivemos intensamente, sempre. Do começo, ao trágico fim. Foi literalmente até que a morte nos separe. E separou. Mas vou em paz por saber que fiz tudo que eu podia, e que eu sempre estive bem perto de você, vivendo ao máximo. Que meu coração foi seu, e se depender de mim, vai continuar sendo. Que daqui do céu (eu espero que seja onde estou), eu te olho sem parar, penso em você constantemente e te guio e protejo. 

Eu não devo ter sido lá a namorada perfeita, mas me esforcei ao máximo pra te deixar sempre com um sorriso no rosto. Nenhum brigadeiro nunca teve gosto tão bom quanto aquele que comíamos juntos. Nenhum filme foi tão divertido quanto aqueles que víamos grudados no nosso cantinho. Nenhum primeiro beijo jamais seria tão bom quanto todos os nossos juntos (por que sim, demos muitos primeiros beijos). Nenhuma simplicidade me encantou tanto quanto a sua, jamais. 

Eu quero que saiba que te escrevo isso não pra que chore e guarde a carta com pingos escorridos entre as letras. Mas pra que a gente tenha mais uma conversa depois de tudo. Ainda somos eu e você, aqui, no tête-à-tête. Pode responder, eu vou ouvir. Sinta saudade, eu também vou sentir. Mas jamais se arrependa do que vivemos, fomos felizes demais. 

Espero que você continue a pessoa maravilhosa que sei que é. Não se esqueça dos aprendizados que coletamos, e das felicidades que vivemos. Você sempre terá sido (e ainda é) um amor incondicionalmente lindo. Obrigada. 

Com amor, eu. 

Julia Fagundes